segunda-feira, dezembro 15, 2008

O Peso e a Cor das Gerações

Os copos devem ter subido cheios e descido vazios várias vezes até a hora que os encontrei. Para ser mais preciso, quando eu cheguei, as línguas de fogo já se agitavam em suas bocas fedorentas de álcool. Trocaram alguns rosnados, alguns grunhidos, e daqui a pouco os passos que subiam apressados para chegar à suas respectivas casas pararam para ver o que acontecia. A arquibancada fora montada e sem juiz, jogados à sorte, os jogadores haviam começado a partida de horrores. À sua esquerda, homens (?) gritando no ápice de felicidade que os hormônios da diversão causam; à sua direita, homens (?) gritando no ápice de fúria que a testosterona causa. O cenário era a floresta de concreto de sempre. Como para climatizar o ambiente, uma TV estrategicamente posicionada dentro do bar tocava as músicas que tornava o álcool todo muito mais atraente. Mas a selvageria era tanta que não se podiam distinguir os berros “harmônicos” de quem cantava, nem no volume incomodo que só os bares conseguem deixar suas músicas.


Quando o segundo ato do espetáculo começou, a torcida – que na verdade torcia pro “todo” – se inflamava em labaredas de adrenalina. E na velocidade de socos, chutes, cabeçadas e mães putas que pariam filhos, um dos homens (?), aparentemente o comprador do espetáculo todo – pois tudo que sobrara da violência mencionada também lhe havia sido dirigido -, é acertado por uma garrafa vazia. Esta que havia sido manejada por uma mão furiosa, encontra seu fim na cabeça raspada do tal “causador”. E antes de “partir desta para melhor”, o recipiente da droga que bancava o show todo, deixa sua marca no mundo: abre um buraco na cabeça do homem (?).


A mão vai à cabeça. Os olhos se fecham fortemente em uma expressão de dor. Uma voz feminina grita, pede que chamem a polícia. O vermelho já chegava à boca e ele ainda insistia na luta. Sua masculinidade toda gritava que isso não ficaria assim. E toda a honra que seu pênis lhe proporcionava forçava-o a recolher um dos cacos do chão e tentar inutilmente acertar mais alguém. A mão aperta com mais força o ferimento.


Daquele buraco e por entre seus dedos podiam-se ver suas gerações escorrerem vermelhas, encharcarem suas orelhas, rolarem pelo seu pescoço e serem absorvidas por sua camiseta regata. Em gotas de história vivida, apressadas, caiam em grandes pingos no asfalto ainda quente. Eu tive certeza que se aproximasse meu nariz daquela poça eu sentiria o cheiro de gerações embriagadas, masculinas, selvagens.


“Meu Deus! Ninguém vai fazer nada?!”, foram as palavras da mesma voz feminina de antes. Dois homens (?), que também participavam do sobe e desce dos copos, se aproximam do Homem-Vermelho e acalmam seus braços, suas pernas, sua voz, mas não o buraco em sua cabeça. Os três se afastam do bar, vão a algum lugar onde pudessem limpar o sangue, tapar o buraco e tratar a raiva. Pelo menos, por mim mesmo, assim desejei que tivessem feito. E ainda desejo.


Apesar de tudo, senti ter pagado pelo ingresso assim como os outros homens (?) que agora se dispersavam. Entristeci-me. Minha coluna curvou, meus pêlos devem ter crescido, meu apêndice voltou a ser útil, meus caninos avançavam na fenda da boca e, se tivesse achado uma pedra dando mole, teria feito fogo ou afiado uma lança pra caçar.

5 comentários:

Fernando disse...

...E eis que escreve esse texto, e se redime de ter voltado a ser um selvagem!

Ótimo, sempre! Agora, fiquei com medo dessa briga toda... Onde se passou?

Amo ^^

Anônimo disse...

Nossa Lorran!!
Adorei o modo como vc descreveu a cena!! Pude até imaginar!!
Vc é um ótimo escritor!!
Quanta emoção!!!

Anônimo disse...

Grande Lorran!

Nem sabia da existencia de um blog seu ^^

q bom q eu o achei!!

Seus textos são muito bons, de fato.

Veja se aparece de vez em quando amigo, pra conversarmos sobre qquer coisa que dê na telha ^^

Abração!!

te cuida ^^

Anônimo disse...

ainda que as lagrimas das vitimas seja simples
o motivo pelo qual ela caem vem de vários erros do passado, tão complexos que nem todos podem entender.
não leitor não os acho inocentes e sim culpados, por não querer ver alem da linha reta, talvez a direita ou a esquerda, o futuro é limitado as nossas escolhas e infelizmente as dos outros tambem...
Nem um homem é uma ilha mas podemos escolher com seriedade as frutas ruins das boas e talvez tratar de mudar um pouco das que não são tão boas assim...
é um caminho melhor ou pior mas o lado que eu gosto dele é que "ele não é reto"

[ADM] Cyber filmes disse...

Legal D+++ esse Blog brother!!

Passando aqui para dar Positividade pro seu blogão!!

sensacional!!

by: Equipe cyber filmes.